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As promessas e os demónios do FM

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O Facility (ou Facilities) Management (FM, na sua forma abreviada) terá nascido na década de 70 e tinha como propósito coordenar as várias áreas relacionadas com o funcionamento e manutenção dos edifícios, numa altura em que alterações ao propósito e layout dos espaços de trabalho eram provocadas pela introdução dos computadores no dia-a-dia das organizações.

Por questões de contexto, e fazendo fé em muito do folclore sobre as origens do Facility (ou Facilities) Management (FM, na sua forma abreviada), esta disciplina terá nascido na década de 70 e tinha como propósito coordenar as várias áreas relacionadas com o funcionamento e manutenção dos edifícios, numa altura em que alterações ao propósito e layout dos espaços de trabalho eram provocadas pela introdução dos computadores no dia-a-dia das organizações.

Desde o seu início e até à década de 90 que encontramos referência a “coordenação” e a “gestão” nas suas definições, bem como à “integração” de “pessoas, espaços e processos”. Na primeira década do novo milénio introduz-se de forma clara a componente “estratégica” bem como a “qualidade de vida” de quem ocupa ou usa os espaços.

Entretanto, uma nova buzzword da gestão e que ganha força nos anos 80, o “outsourcing”, vai ajudar e ao mesmo tempo complicar a vida do FM. O conceito por detrás desta nova ferramenta ao dispor das administrações consiste em separar entre “core” e “não-core” as atividades da organização, promovendo a subcontratação a terceiras partes daquilo que não é “core” e ficando e empresa com mais recursos disponíveis para se concentrar naquilo que é o “importante”. Ou seja, invertendo o sentido da frase de forma simplista (mas, infelizmente, algo que é comum) podemos então inferir que o FM é a disciplina que se encarrega daquilo que não é importante (pois não é core) para a organização.

Acresce ainda que, para algo que não é importante, o FM é, fora do ambiente industrial e de talvez um ou outro setores específicos, o segundo maior custo, logo a seguir às remunerações, de uma empresa.

Montando então o palco, podemos avançar para alguns dogmas, aparentes paradoxos e simples barreiras organizacionais, que justificam o título deste artigo:

  1. “Não-core” é o mesmo que “Não-importante”: este é um dogma perigosíssimo e cria o precedente para quase todos os pontos seguintes. Qualquer tarefa é tão importante como o seu resultado. Imaginem uma empresa de desportos radicais considerarem como “core” a criação e o desenho de novas e entusiasmantes experiências de alpinismo e relegarem os arneses para “não-importante”. É natural que subcontratem a sua produção mas ao mesmo tempo que se assegurem da sua máxima qualidade e também da disponibilidade.
  2. “Cost-Cutting”: mais comum do que seria desejável, o FM é visto como uma área de corte de custos. Em cada concurso e ida ao mercado há sempre menos orçamento para contratar prestadores de serviços do que havia no anterior. Quando a área financeira promove uma iniciativa de redução de custos, o FM é sempre o primeiro a ser convidado a emagrecer. Ora o FM deve ser “fit” como as restantes áreas das organizações mas deve também ter um target de qualidade, ou seja, tal como quando se contrata um revisor oficial de contas ou se compra um servidor, queremos ter a melhor qualidade ao melhor preço e não o mínimo preço (qualidade pode aqui significar um único ou um conjunto de atributos quaisquer, desde que relevante para o que se está a considerar).
  3. Receber propostas de inovação (e de investimento…) de quem devia se preocupar em reduzir custos: no seguimento dos anteriores, compreende-se como será difícil para alguém na área do FM ser considerada como fonte credível e relevante para “gastar” dinheiro, ao invés de o “poupar”. Hoje em dia são inúmeras as áreas onde o FM é imprescindível, seja a liderar, a coordenar ou a auxiliar. Do atingimento das metas de redução da pegada de carbono ao compliance da operação da organização, do assegurar o valor dos ativos a proporcionar um ambiente que promova a atração e a retenção de talento.
  4. Os silos funcionais (ou ilhas disfuncionais): de facto este é um problema (ou um desafio…) generalizado dentro das organizações, e em relação ao qual provavelmente todas as áreas funcionais se queixam. No entanto, arrisco dizer que a área de FM será a mais prejudicada. Isto porque o FM ganha relevância e impacto com a escala e a integração, ou seja, quantas mais pessoas e mais serviços cobrir mais benefícios trará. Quanto mais se conseguir articular e colaborar com RH e com IT, mais conforto e comodidade poderá oferecer.
  5. Dizer como quero e não o que quero: este aplica-se especialmente na relação com o subcontratado e é, em simultâneo: um dogma perigoso, um paradoxo e o resultado de barreiras organizacionais. Passo a explicar: quando olhamos para a maior parte dos cadernos de encargos encontramos receitas detalhadas de como o serviço deve ser entregue, desde a periodicidade do serviço à percentagem de algodão da farda do trabalhador. Cria-se uma camisa de forças que inviabiliza que melhorias de processo (ou outras) beneficiem o prestador bem como o cliente. Provoca-se também uma falta de standard que reduz as melhorias e a escalabilidade, pois cada entidade obriga a que se faça de uma forma diferente (à sua maneira).

Em conclusão, e aceitando como certa a década de 70 para a criação do FM, estamos com 50 anos de experiência nesta área, beneficiando de termos nascido numa era em que o computador já existia e que os departamentos de RH já tinham cunhado a expressão “capital humano”. Como filhos destas e de outras modernidades, pensar-se-ia que a nossa projeção seria rápida mas, para mal das nossas organizações, seguimos lutando contra demónios internos.

Hoje é o Dia Mundial do FM, que dogma vamos destruir juntos?